REFRESCOS - #33 Maldição
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na hora de contratar um prestador de serviços, certifique-se se que ele não esteja amaldiçoado
ter uma mente com predileção para pensar em tragédias e fotografar casamentos é estar sempre operando no modo “gente, que irresponsabilidade. já pensou se a criança cai desse barranco? se esse idoso tropeça no tapete?”. até hoje nada de muito grave aconteceu diante de meus olhos. lembro apenas de um episódio que tinha potencial para ser catastrófico, mas houve leniência das forças malignas que operam no brasil (como bom funcionário público que não quer mais serviço para o seu lado, fizeram vista grossa)
o episódio: os noivos ganharam de presente de casamento de um padrinho a filmagem do casamento. como se não bastasse o desvio da lista de presentes, o padrinho ainda por cima contratou uma equipe que consistia em 3 homens abobalhados. o comportamento dos três era tão inadequado que em certo momento cheguei a cogitar se não era o caso de cada um deles ser um conjuntinho de dois garotos em um sobretudo. hipótese rapidamente descartada porque, fosse o caso, os garotos iam ao menos tentar manter certa compostura na tentativa de não atrair desconfianças para seus lados. não era o caso ali. os três patetas pareciam acreditar que noivo, noiva, familiares, padrinhos e demais convidados estavam lá única e exclusivamente para servi-los. todos estavam reunidos para que imagens em movimento fossem captadas. imagens essa que transitavam entre o cafona e uma novela do SBT. chamavam a noiva pelo nome errado, ordenavam que os noivos e padrinhos fizessem determinadas poses com um tom de voz e olhares ameaçadores e enfiavam suas câmeras a centímetros do rosto dos convidados. resumindo: tomaram o casamento de assalto. a noiva ameaçou expulsá-los da festa uma hora antes da cerimônia começar, mas acabou voltando atrás. foi um erro de cálculo. a sua misericórdia quase custou muito caro: segundos antes de ela entrar na cerimônia, já posicionada na frente da porta do casarão por onde ela sairia para entrar na cerimonia (que ocorreria no gramado da fazenda), um tranco na porta vindo de fora fez uma das lâminas baterem diretamente no rosto da noiva. era um dos três patetas da equipe de filmagem querendo entrar. pela porta. da noiva. as cerimonialistas empurraram a porta de volta, que por sua vez empurrou o pateta que gritou — sim, gritou — de lá de fora “EU PRECISO ENTRAR”, como se estivesse sendo perseguido por uma turba de zumbis. a cerimonialista respirou fundo e redirecionou aquela bomba: “tem uma porta aberta ali do lado”. tivesse a noiva uma constituição epidérmica um pouco mais frágil, ou então a maquiagem utilizada não fosse robusta a ponto de funcionar como um escudo, ela teria corrido serio risco de entrar na cerimônia com um galo na testa ou um sangramento nasal.
mas o que eu queria comentar nesse texto é outra coisa (pensem em tudo que veio antes desse parágrafo como um grande e desnecessário preâmbulo). eu queria dizer que uma vez conheci uma equipe de filmagem de casamentos que era amaldiçoada. problemas dos mais variados níveis de gravidade ocorriam nos casamentos que eles filmavam. teve um casamento em que maurício — vamos chamá-lo assim — estava fazendo o making of do noivo e na cabeceira do quarto viu um porta retratos com a foto de uma mulher. perguntou, com um sorriso largo: “é a noiva?”. e o noivo: “não, é a minha irmã que morreu em um trágico acidente de carro”. maurício ainda tentou se reerguer e resgatar o clima falando alguma coisa no sentido de a falecida irmã estar abençoando a cerimônia mas era tarde demais. a viola já estava em cacos. noivo e pai do noivo, chorando, sentaram mauricio na cama e o que se seguiu foi uma reconstituição meticulosa do acidente que vitimou a mulher. com os estados de espirito completamente arruinado, noivo e pai do noivo cancelaram o making of. em outro casamento, a mãe de noiva, justamente no momento de sua entrada triunfal, sofreu uma queda. mas não foi seu corpo que caiu e sim seu pivô. o dente, não satisfeito em cair, saiu rolando feito uma bola de ping pong. foi preciso pausar a cerimônia por alguns minutos e recrutar alguns convidados para as atividades de busca. em outro casamento, antes de começar a cerimônia, a vó do noivo aproveitou uma distração de seus familiares e permitiu-se uma pequena transgressão: quis descer uma escada sem ser supervisionada. tropeçou logo nos primeiros degraus, rolou escada abaixo, se machucou e precisou ser levada ao hospital. durante o casamento inteiro um familiar emitia boletins do estado de saúde da idosa diretamente do hospital.
na cerimônia de casamento onde conheci maurício e ele me contou essas histórias, aconteceu um contratempo também: no meio da entrada da noiva a música parou de tocar. sem saber o que fazer, a noiva e seu pai estacaram no meio do caminho como se eles também tivessem sido desligados, junto com aparelho de som. por longos minutos, não só a noiva como todos os convidados se mantiveram petrificados enquanto o técnico de som corria pra lá e pra cá apertando botões, plugando e desplugando cabos sem efeito algum. até que um outro homem, livre do feitiço da imobilização, foi ao resgate do técnico (a essa altura só desejando largar tudo e sair correndo para nunca mais ser visto na cidade) foi lá e,gozando da boa sorte dos leigos, fez sei lá o que e a música retomou.
diante do exposto, não seria totalmente despropositado inferir que a música parou porque quem estava filmando o casamento eram maurício e carla — vamos chamá-la assim. então pense nesse texto como uma advertência: quando for contratar um prestador de serviços, tente sondar por aí se ele não é amaldiçoado. como você vai fazer isso eu não faço a minima ideia, mas imagino que seja de bom tom tentar jogar de maneira despretensiosa no meio da conversa: a propósito, você não é amaldiçoado não, né? porque a gente ouve cada história hahaha”
A Maldição do Zé Foguinho
Era - e talvez ainda seja - um hotel fazenda no interior de São Paulo. Desses enormes, que durante a noite não se enxerga nada além de pequenas iluminações na área dos dormitórios, o resto todo um breu, às vezes cortado pela ousadia da lua cheia.
Era ali - e nesse caso acredito que não seja mais - que contavam a história da Maldição do Zé Foguinho para todas as crianças de olhares atentos que vinham passar as férias. Umas com a boca escancarada de surpresa, outras completamente céticas “eu vi um filme muito pior no Corujão”. Ah, sim, isso foi nos anos 90.
Os “tios” contavam sérios, dentro de cafofos feitos com cobertores fechando as beliches e iluminando a cara com uma lanterna de baixo pra cima, alertando que ninguém, em hipótese alguma, acendesse uma vela depois da meia noite.
Se isso alguém fizesse, podia notar que naquela pequena capela branca, lá na entrada da fazenda, antes do mata-burro, ouvia-se o choro de um neném.
O neném tinha sido filho de uma antiga empregada, que morreu dentro de casa em um terrível incêndio, e que então assombrava a fazenda com seu choro não solicitado.
“Ai tio, para, tô ficando com medo”, alguma pré-adolescente falava.
“Melhor ter! MUAHAHAHAHA"
“Paaaara!!! Credo!!! Ô GIOVANA, ACENDE A LUZ!!”
“Ninguém vai acender a luz!!! A Maldição do Zé Foguinho é real, vocês vão ver!”
Luis Guilherme acendeu a luz, “quem quer jogar Uno?”.
E lá se foram os 6 pré-adolescentes jogar Uno, parcialmente esquecidos da Maldição do Zé Foguinho.
Dia seguinte, os tios não se conformavam. “Essas crianças de hoje não se impressionam mais”. E tiveram uma ideia.
Esperaram uns dias passarem, mencionando vez ou outra a tal capela do neném queimado. Deixaram ali, de fundo, a ideia do defunto.
Até então que em uma das noites depois, enquanto decidiam qual jogo distrairia até o sono bater, alguém - quem? - foi lá atrás e desarmou a chave geral.
Dormitório preto, escuridão.
“Ah pronto, o gerador deve ter pifado…”
“Cadê as lanternas?”
“Tavam aqui”
“Acende aquela vela ali do lado da janela, Juliana”
“Me empresta o isqueiro?”
“CUIDADO! A MALDIÇÃO DO ZÉ FOGUINHO”
“Ah, tio, de novo Zé Foguinho?”
“Zé Foguinho, Zé Foguinho, Zé Foguinhooooo” gritava Gabriel triscando o isqueiro na cara de Juliana.
“Para, vai queimar meu cabelo”
“SILÊNCIO!!!!”
“O quê?”
“Vocês ouviram isso?”
“Para tio, tá me assustando”
“É sério, eu escutei um negócio. Tem alguém que não tá aqui?”
“Tá todo mundo aqui”
Lá fora, um som de choro de neném ecoa, bem de longe.
“AI MEU DEUS” - Fernanda aproveitou para abraçar Luis Guilherme com toda força e vontade hormonal acumulada nos últimos dias.
De repente, um som de fósforo riscando de trás do cafofo fez todos olharem para trás e FLUF!!!!!
Na parede do dormitório, os tios haviam usado gel acendedor de churrasqueira para desenhar uma cruz na parede. A cruz brilhava em azul e vermelho.
O fogo subiu, gritos por todos os lados, mas o gel era fraco e se apagou antes que os limites da zoeira fossem ultrapassados.
Mas agora as crianças já estavam chorando. Gabriel quase mijou nas calças.
Os tios rindo, acendendo a luz.
“NÃO DUVIDEM DA MALDIÇÃO DO ZÉ FOGUINHO”
“Ridículos, vocês são ridículos” bradava Fernanda, abraçando Maria Clara aos prantos.
E sim, a história morreu ali. Riram, voltaram para o cafofo, jogaram Uno noite a dentro. Alguns tiveram pesadelo naquela noite. Deixaram a luz do banheiro acesa a semana toda por via das dúvidas. Até hoje lembram disso quando vêem capelinhas de beira de estrada e dão risada. Nenhum dos pais destas crianças soube, o hotel fazenda não foi processado.
Os tempos sem celulares permitiam imprudências - e pegadinhas de terror serem executadas. Isso nunca mais vai acontecer com a realidade de hoje. Zé Foguinho descansa em paz. Acho.
uma maldição
uma dica
Haunted Elevator (ft. David S. Pumpkins) - SNL — www.youtube.com
Se você não sabe quem é Mr. David S. Pumpkins, veja este vídeo...
vai lá seguir
Um Felipe disse by Felipe Fagundes — tinyletter.com
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